domingo, 28 de junho de 2015

DISCUTINDO A REFORMA DO ENSINO MÉDIO.

DISCUTINDO A REFORMA DO ENSINO MÉDIO.

Pessoas do face preocupadas com a educação pública no Estado de São Paulo, amanhã estaremos na Alesp às 19h00 plenário José Bonifácio na audiência pública sobre a reforma do ensino médio que ficará registrada nos anais da Assembleia. Compartilho o texto que hoje escrevi para o debate em Mauá, ele está em construção mas já tocamos aqui em alguns pontos que dialogam com a leitura de mundo vivida.
Debate no município de Mauá sobre a Reforma do Ensino Médio (Psol-Mauá)
28/6/2015
Participação: Aldo Santos, Bruno Daniel e Cristiane Gandolfi.
Minha participação neste encontro tem por objetivo compartilhar o acumulo construído no campo das lutas em defesa das Ciências Humanas travadas pela Sociedade Civil no campo educativo. Como socióloga, pedagoga, mestre em educação e professora desde o ano de 1992, elegi a educação como importante tema de vida, uma vez que dela não retiro somente o sustento do pão, é para ela que dedico horas que visam a formulação de um mundo melhor, diferente do vivido.
Este início de conversa aponta o valor dado a palavra práxis na vida humana, se na modernidade capitalista é possível vivenciar alguma experiência de inteireza certamente isso se faz para além de suas margens; é o movimento social, a participação política, em suma o desejo de melhorar o espaço público que possibilita ao cidadão e cidadã o descortinar de outro horizonte. Inspirados por estes paradigmas um pequeno grupo de professores de filosofia, sociologia do ensino médio e superior se uniram para debater a Reforma do Ensino Médio, por meio da liderança dos filósofos sediados na Aproffesp e Aprofib.
A filiação ao PSOL foi um ponto em comum entre nós, embora o movimento seja suprapartidário temos nele vários militantes do Partido Socialismo e Liberdade, sobretudo dos pertencentes a corrente política TLS( Trabalhadores na Luta Socialista). Até o momento fizemos 5 encontros e temos debatido desde o Projeto de Lei 6840/13 até a mudança de Ministro da Educação e as discussões acerca da Base Nacional Comum do Currículo do Ensino Médio e o Projeto de Pátria Educadora.
Com a liderança do professor Aldo Santos(Aproffesp) em agosto de 2014 tivemos nosso primeiro encontro, logo após participamos de uma mesa redonda no Congresso da Universidade Metodista, em seguida nos encontramos na Câmara Municipal de São Paulo, logo após na Casa do Professor da Apeoesp SP, levamos essa discussão para o Eregeo( Encontro de Estudantes de Geografia realizado na Fundação Santo André) e agora participamos deste evento do Psol de Mauá. Vale lembrar que já temos uma participação marcada para o dia 29 de junho de 2015 na Alesp , no Plenário José Bonifácio às 19h00 na audiência pública sobre a Reforma do Ensino Médio no Estado de São Paulo solicitada pelo deputado Carlos Gianazzi junto aos participantes do Movimento que defendem o ensino de qualidade para os filhos e filhas da classe trabalhadora. Nossa perspectiva é a de que a educação não seja mera reprodução de classe, que haja nela a possibilidade de mobilidade social ascendente via a igualdade de oportunidades para todas as famílias que compõem a classe que vive de seu trabalho.
O Projeto de Lei 6840/13 foi o elemento impulsionador deste encontro, a partir de seu estudo foi possível entender que a Reforma do Ensino Médio pode afirmar as diferenças de classe social via educação na sociedade brasileira. Nós, do movimento, defendemos uma Escola Básica composta por um Currículo sedimentado em Ciência, Cultura e Consciência Humana, valorizamos os conteúdos disciplinares sobretudo quando estes são postos a luz da realidade constituindo entendimento do real e crítica aos modos de ser e produzir a vida econômica e social. Portanto, para nós, educação é um bem imaterial indispensável à vida, ela é muito mais do que reprodução dos modos de ser da civilização vigente. Entendemos que educação é reprodução e produção de cultura, portanto se faz para além das determinações de mercado, do mundo do trabalho e das práticas culturais hegemônicas de nossa sociedade de classe.
Essa afirmação é necessária pois no Pl 6840/13 não teremos mais as Ciências com seus saberes a frente do currículo, o que vemos é uma organização curricular sedimentada em 4 campos de saberes e uma parte diversificada nucleada por uma diversidade de temas que compõe a experiência humana. Sobre os campos de saber teremos : Matemática como disciplina nuclear que se quer como área de conhecimento, Ciências da Natureza nucleando as disciplinas de física, química e biologia, Linguagens ( língua portuguesa, estrangeira, artes, física e computação) e Ciências Humanas( história, geografia, sociologia e filosofia).
Cabe destacar que o PL 6840/13 aponta como base nacional comum do currículo do ensino médio da escola de tempo integral, estruturada no tempo escolar de 1400 horas anuais, o estudo
da língua portuguesa; da matemática; do conhecimento do mundo físico e natural; da Filosofia e da Sociologia; da realidade social e política, especialmente do Brasil; e uma língua estrangeira moderna, além daquela adotada na parte diversificada, conforme dispõe o art. 26, § 5º (língua estrangeira a escolha da comunidade).
Nota-se aqui a ausência da História e Geografia como Ciências Humanas e Sociais, não se sabe se pelo fato de no ano de 2008 ter sido sancionada a lei 11.684 que garante a obrigatoriedade da sociologia e da filosofia no currículo do Ensino Médio ou por elas já garantirem seu lugar no currículo escolar uma vez que trabalham os componentes que lidam com o tempo e o lugar. Neste sentido vale a pena destacar os eixos temáticos transversais propostos neste Projeto de lei, os quais apresentam maior objetividade do que a estruturação dos campos de saberes, deste modo temos nos questionado se os temas transversais são meio ou fim no currículo da escola de ensino médio?
O Pl 6840/13 sintetiza a diversidade de contextualização de vida das juventudes do ensino médio por meio da aprendizagem de prevenção ao uso de drogas e álcool; educação ambiental; educação para o trânsito; educação sexual; – cultura da paz; empreendedorismo; noções básicas da Constituição Federal; noções básicas do Código de Defesa do Consumidor; importância do exercício da cidadania; ética na política; participação política e democracia. Uma de nossas questões é saber que saberes, habilidades, competências e formação acadêmica devem ter os profissionais que serão professores destes temas?
Outro elemento relevante da lei é a possibilidade do aluno escolher temas de estudo ancorados em áreas de saber, aqui reside a armadilha de reprodução de classe via educação. Os filhos e filhas da classe trabalhadora escolherão um currículo formatado em profissões liberais, do chão da fábrica, de serviços ou visando a Universidade? Parece-nos que podemos reforçar o caráter reprodutor de classe na educação. Este fato não é novo ele se desenha desde a promulgação da lei de diretrizes e bases da educação nacional e das diretrizes do ensino médio lá dos anos noventa do século XX, contudo parece-nos que agora chegou o momento de reestruturar a produção escolar e reacender a estrutura do antigo MEC-USAID estruturado pelas leis 5540/68 e 5692/71. Naquele contexto centralizador, o mundo do trabalho buscava a disciplina fordista-taylorista como elemento de produtividade e a sociedade política autoritária tinha na educação a forte expectativa de realizar controle social por dentro do currículo e da máquina estatal educativa, selecionando aqueles que se inseririam no mundo do trabalho e deixando para atrás os que ficariam pelo caminho, portanto, objetivando a manutenção do status quo da época.
Na atualidade o modo de produção capitalista vivencia uma nova fase, segundo Richard Sennett estamos todos à deriva, transitamos da segunda revolução industrial para a terceira e ainda não se sabe quais as formas concretas desta formação social em ebulição. Há algumas pistas e parece-nos que tanto o Pl 6840/13, quanto as argumentações da professora Guiomar Namo de Mello, bem como os indicativos da Pátria Educadora e argumentações de Mangabeira Unger nos remetem a deduções do tipo: estamos diante de um novo Mec-Usaid típico de uma nova formulação do modo de produção capitalista no Brasil?A organização do trabalho típica do toyotismo e acumulação flexível do capital demandam que tipo de educação e de capital humano? Neste sentido questionamos também, no período autoritário datado de 64-84 o caráter de controle social na educação foi de extrema relevância na política educativa da época, e nos dias atuais, qual o caráter da educação contemporânea? Como se realiza o controle social via educação no contexto da acumulação flexível?
Essas são algumas questões que nos tem feito pensar sobre a importância de um Movimento Social suprapartidário em defesa das Ciências Humanas. Lendo a entrevista de Guiomar Namo de Mello para o CIEE(Centro de Integração Empresa-Escola) do ano de 1998 localizamos palavras-chave que nos remetem ao tipo de educação contemporanea que se afina tanto com o PL 6840/13 quanto com as entrevistas dadas por Mangabeira Unger e o texto do documento Pátria Educadora. Citaremos algumas delas:
1. enfraquecimento do conceito científico típico da educação moderna, dos saberes advindos da escola burguesa iluminista e fortalecimento das habilidades e competências típicas do mundo fabril.
2. Valorização da educação para o mundo do trabalho.
3. Valorização da autonomia intelectual por parte do aluno, conhecimento dos fundamentos científicos e tecnológicos dos processos produtivos, relação entre teoria e prática em cada disciplina do currículo.
4. Valorização aos significados das ciências, das artes e das letras e não mais aos conteúdos lidos como componentes curriculares.
5. Valorização a língua portuguesa como instrumento de organização cognitiva da realidade e de matemática como pesos, medidas e raciocínio lógico.
6. Maior tempo de estudo para jovens do ensino noturno.
7. “Nossa proposta é que o ensino médio supere a dualidade profissional ou acadêmica e se volte para uma diversidade que pode ser mais profissional ou mais acadêmica, dependendo da clientela(Mello, 1998, p. 25).
8. Guiomar Namo de Mello dialoga com uma escola da sociedade da informação, para ela a escola deve ser uma ponte de significados, o papel do professor é fazer a transposição didática, cuja a finalidade dos conteúdos é ancorar as competências, essas são a finalidade da educação.
9. Valorização da contextualização e sobretudo da diversidade de contextos, daí podemos supor a quantidade de temas presentes no PL 6840/13.
10. Para Mello não há um único currículo de base comum nacional, este deve ser definido pela escola. Entendemos que aqui reside a maior das armadilhas para a manutenção da escola reprodutora de classe, uma vez que a escola de modo descentralizado definirá a Base Nacional Comum do Currículo, logo ela deixa de existir de modo universal e localmente reproduz os modos vigentes da população local.
Nestes cinco encontros que realizamos, inclusive debatendo o papel da gestão escolar a partir das referências do documento do instituto cultural do Banco Itaú sobre a Reforma de Nova York, por ora temos constituído a seguinte síntese:
1. A lei 11.684/08 caminha na contra-mão do Projeto de Reforma do Ensino Médio, seja o do PL 6840/13, seja o de Guiomar Namo de Mello, seja o da Pátria Educadora, pois ela garante a obrigatoriedade do ensino de sociologia e filosofia no ensino médio e este é tido como experiência facultativa, reprodutora do nível cultural das populações locais.
2. A organização curricular do ensino médio respeitará a formação profissional em licenciatura plena exigida pela ldb 9394/96? Guiomar Namo de Mello se referencia a não ter feito propostas que superem os feudos acadêmicos e a divisão de ciências dentro das áreas do saber. Essa prerrogativa caberá a escola? Ela contribuirá com a definição da base nacional comum local? No funcionamento da escola voltaremos às licenciaturas curtas ou a direção escolar definirá o currículo a partir de arranjos administrativos locais?
3. Essa educação contemporânea oportunizará a experiência de mobilidade social ascendente no interior da classe trabalhadora ou o desenho curricular que se põe é de reprodução da herança cultural da estratificação social vigente.

Texto em construção
Professora Cristiane Gandolfi.

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